segunda-feira, 25 de junho de 2012

FIT 2


É difícil para quem atua nas artes conciliar sua vontade louca de acompanhar tudo que o festival mostra com as urgências do trabalho, no caso a montagem de dois espetáculos que irão estrear no segundo semestre. Sei que estou perdendo muita coisa boa como “Voyageurs Immobiles”, “Estamira” (para o qual simplesmente não consegui achar ingressos), “Mistero Buffo” ou “Translunar Paradise” ou o israelense “Quiet” que dividiu tanto as opiniões. Outros eu optei por não assistir pelo tamanho dos trabalhos (mais uma vez a falta de tempo), é o caso de “O Idiota” (que pelo que soube também tem dividido opiniões) e “Ópera dos Vivos”. Mas vou deixar de falar do que não vi para me concentrar no que de fato consegui assistir.
Talvez eu seja um artista que esteja um pouco na contramão da moda teatral. Eu particularmente gosto de ir ao teatro para que me contem uma história, gosto, portanto, do teatro que preza a palavra bem falada e o ator que sabe conduzir sua fala, seu corpo e suas emoções em prol dessa exigência.
Dentro desse teatro que preza a palavra, gostei de dois espetáculos que vieram do Cone Sul: “Villa + Discurso”, do chileno Grupo Teatro Playa. Três belas atrizes se revezaram no palco do pequeno auditório da velha Fafich (que nunca deveria ter deixado de ser Fafich por mais que as instalações do campus na Pampulha sejam mais espaçosas). Um espetáculo simples e comovente. Necessário. A discussão sobre o destino a ser dado a um antigo centro de detenção, tortura e extermínio de opositores da época da sinistra ditadura de Pinochet, serve como pano de fundo para falar da própria condição do Chile pós-regime militar, dos dilemas da esquerda e da situação dos filhos da ditadura, como se parte da sociedade chilena desejasse passar a limpo aspectos de seu passado e seus laços com o presente representados pelo discurso de despedida da presidente Michele Bachelet, cujo pai foi morto pela regime de Pinochet.
É difícil não pensar no Brasil. Primeiro até por certa proximidade histórica entre a nossa presidente e a do Chile. E depois pelo tipo de teatro que é feito no país desde os anos 80. Aqui, quando se pensa em fazer algum espetáculo de cunho político cujo tema seja a ditadura ou suas sequelas, as pessoas não dão a menor confiança, pois trata-se de um assunto “datado”. O teatro praticado nos países vizinhos mostra que não. Que não se pode esquecer os abusos, as violações, os massacres, que não se pode simplesmente deixar esse passado de lado. Não é permitido esquecer e um bom caminho para o não esquecimento é falarmos disso tudo.
Outro bom exemplo de simplicidade, interpretação limpa e apreço à palavra é o ótimo “Tercer Cuerpo” dos argentinos do Grupo Timbre 4. Um cenário simples, um escritório que ao mesmo tempo é um bar ou um consultório médico onde cinco ótimos atores desfilam suas angústias, seus medos, sua incrível solidão. Assim como “Los Hijos Se Han Dormido”, mais um exemplo de interpretação realista contida, quase televisiva, que pode ser detestável para alguns, mas que eu considero um primor pelo rigor do que é dito e pelo trabalho sobre as emoções. Me deu vontade de ir para Buenos Aires estudar com eles. Quem sabe eu não faça isso ano que vem?
“Abito”, da Fondazione Pontedera Teatro é outro belo e instigante espetáculo. Um ambiente de sonho e alucinação no qual é mergulhado seu protagonista que não consegue retornar. Belo e tocante. Mais um mergulho na solidão, como o é, aliás, “Depois do Filme”, solo do diretor Adherbal Freire Filho. Um pouco sujo na atuação, como se o ator buscasse o tempo todo em sua memória as palavras que lhe faltam, mas muito interessante. Li recentemente ao excelente “Memória de Elefante”, de António Lobo Antunes. A história me comoveu. Histórias de solidões masculinas me tocam e a história recém lida me fez entrar no discurso de Adherbal e do Pontedera e me sentir parte deles.
Por fim, “Theatre”, do grupo tcheco Farm in the Cave. Teatralmente falando eu gostei mais do trabalho anterior mostrado na edição 2008 do FIT.  Mas como não se encantar com tamanha profusão física e vocal do excelente grupo do leste europeu. Muito mais um espetáculo de dança que de teatro a bem da verdade e que em determinados momentos me pareceu ser uma demonstração de virtuosismos, mas assim mesmo encantador e como a dizer que a dramaturgia contemporânea, para além da lógica das palavras (e eu que gosto tanto delas) consegue muitas vezes aportar com propriedade nos corpos e vozes de bons atores extraindo momentos sublimes.
Por questões de trabalho não consegui ver mais nada. Nem os “Sin, título: técnica mista”, nem “Gólgota Pic Nic” para os quais inclusive eu tinha ingresso. Mesmo tendo visto tão pouca coisa, penso que o FIT foi mais uma vez muito produtivo e deixou, como sempre deixa, aquele seu tradicional gostinho de quero mais.

domingo, 10 de junho de 2012

FIT


O FIT começou. Pela 11ª vez desde aquela tarde maravilhosa de 1994 (um ano muito bom para mim) em que os franceses do “Genérique Vapeur” encantaram a cidade com sua performance de ocupação coletiva.  Depois dos percalços da edição de 2010 que esteve a ponto de não acontecer por problemas de ordem política, a versão 2011 está sendo apresentada como a maior já realizada até agora. Nós que além de amarmos o teatro fazemos dele nossa profissão, esperamos que sim.
Olhando para a grade apresentada pelos organizadores há de fato muita coisa interessante para conferir, como, por exemplo, os tchecos do Farm in the Cave que brilharam por aqui na edição de 2008. Da seleção local fiquei surpreso com certas escolhas. Não vou entrar no mérito da qualidade artística dos trabalhos escolhidos, mas sinceramente não vejo sentido em duas coisas: primeiro, por mais que estudiosos e pesquisadores afirmem que as fronteiras entre as artes estejam cada vez mais tênues a ponto de termos dificuldades em definir, por exemplo, o que seja o teatro na contemporaneidade, não consigo concordar com a seleção de espetáculos de um grupo de dança, mesmo por que a cidade tem tantos festivais específicos (circo, teatro de bonecos, teatro de objetos, dança, performance) que não vejo justificativa para se colocar tantos gatos no mesmo balaio. Em segundo lugar a escolha de espetáculos que não são novidade na cidade, que já estiveram em cartaz alguns anos atrás e que não participaram de edições do FIT próximas ao ano de seu lançamento. O que aconteceu? Dentre os inscritos para a edição atual não haviam espetáculos ou outras companhias com qualidade suficiente? Ressalva feita a “Romeu e Julieta” do Galpão, por que afinal é um dos melhores espetáculos já produzidos no estado e o grupo está fazendo 30 anos e se apresentou mais uma vez no palco do Globe Theatre, etc. Mas não é o caso de outros trabalhos escolhidos.
Fico pensando nos critérios quando vou assistir a um espetáculo como “Los Hijos Se Han Dormido”, do argentino Daniel Veronese que já esteve por aqui em edições passadas à frente do grupo Periférico de Objetos. O espetáculo apresentado é uma versão de gabinete do clássico “A Gaivota” de Tchecov. Na montagem apresentada  não temos um desenho de luz, mas tão somente uma mesma geral branca,  um cenário beirando ao tosco – uma simples sala com três entradas, figurinos simples parecendo roupas do dia a dia que cada ator levou para o palco, nem trilha musical. Também não havia uma direção espetaculosa, nem tampouco uma teatralidade que saltasse aos olhos e, como estamos em um festival, o espetáculo parece se ressentir de não ter um conceito. O incômodo foi imediato. Dezenas de pessoas (mal educadas na minha modesta opinião) abandonaram o barco antes que ele pudesse atracar. Tudo bem. Um espetáculo tão pobre de recursos cênicos e ainda por cima falado em espanhol e com legendas projetadas acima da platéia, é demais.
Comentário que ouvi depois da apresentação: fosse montado por alguém de BH teria sido execrado. Certamente. Ou não, quem sabe?
O que vimos no palco do Grande Teatro do Palácio das Artes ontem foi uma exibição de técnica de atuação naturalista. Quase atuação para televisão ou cinema. O que me impressionou (e por isso gostei do espetáculo – minha eterna vocação de nadar contra a corrente) foi a consistência do trabalho dos atores expressa pela palavra bem falada (apesar de entedermos pouco a língua – o que é um pecado cultural – conseguimos identificar sua musicalidade), na construção das pequenas ações, no estar apenas olhando por uma janela e esse apenas olhar pela janela nos prende a atenção, nos corpos bem colocados em cena, sem exageros. Para mim foi uma atuação primorosa. Nada de cotovelo direito no céu da boca, nem palavras desconexas expressando a angústia contemporânea (em minha opinião expressando muitas as vezes a falta do que dizer). Já ouvi muita gente boa falar que teatro se faz com ator e texto (se bem que nesse último quesito há muitos que torcem o nariz) e quando aparece um espetáculo que é tão somente ator e texto as pessoas não gostam.
Meu amigo Tinho que mora no Rio já me disse que essa é meio que uma moda por lá. Uma atuação mais televisiva ou tendendo mais para o cinema. Pensei também em Eduardo Tolentino e em seu Grupo Tapa de onde saiu a premiada atriz Sandra Corveloni ( Palma de Ouro em Cannes por Linha de Passe). Eles certamente não teriam vez em BH. Diz a lenda que quando mestre Grotowski esteve em Pindorama assistiu espetáculos de vários grupos locais e que o que ele mais gostou foi do trabalho do Tapa. Enfim.
Voltando ao comentário ouvido à saída do teatro: foi o que me fez, mais uma vez, pensar nos critérios de escolha, na política do festival. Com certeza, se o espetáculo fosse local passaria bem longe do FIT como outros que se aproximam levemente da estética proposta por Veronese de fato passaram. Fico pensando em dois pesos e duas medidas. O que dizer?
Sei que gostei de ter visto apesar de ter tido dificuldades de me concentrar. Tudo bem que o Grande Teatro é uma sala que possa conter muita poeira, ácaros e mofo e que, por estarmos em junho, temos uma propensão maior a ter problemas respiratórios, etc. Mas o ambiente ontem estava mais para sanatório de tuberculosos do que para teatro. Meu amigo João ponderou que isso poderia ser uma reação da plateia ao próprio espetáculo. Pode mesmo, mas a orquestra de tosses começou tão logo as luzes se apagaram...
Legal também foi ter visto ao ótimo “Sua incelença, Ricardo III”, da companhia potiguar Clows de Shakespeare. Com direção de Gabriel Vilela, o trabalho parece ser uma verdadeira versão nordestina de “Romeu e Julieta” do Galpão. Não chega a ter a mesma poesia que o modelo mineiro, mas isso a meu ver se deve muito mais ao texto que é radicalmente diferente e também ao fato de o Galpão ter atores bem mais maduros. Um belo e inspirador trabalho.
Ponto de encontro: uma vez mais é no Parque Municipal. Eu continuo preferindo os bares tradicionais, ou seja, a minha velha Cantina do Lucas de guerra. Não curto bares da moda, a não ser que o bar da moda seja realmente um bom bar o que se traduz por cerveja gelada, boa comida, preços razoáveis e atendimento de primeira. Gosto de ir a um bar, sentar, beber e conversar. Ir a um lugar somente para ser visto como pessoa descolada não faz a minha cabeça. Mesmo por que o ponto de encontro sempre me pareceu uma quermesse Cult.

Síria


Até quando o mundo irá silenciar covardemente frente ao que acontece na Síria? Em quinze meses de protestos e luta por democracia mais de quatorze mil mortos. Se isso não for um genocídio eu não sei o que realmente é. Ou será que precisaremos chegar a cifra de um milhão de mortos para que a “consciência ocidental progressista” tome alguma atitude? Mas a Síria não tem petróleo e as potências do “mundo livre” não parecem dispostas a constranger Rússia e China tradicionais aliadas do despotismo do clã Assad, especialmente a última por óbvias razões. Não se trata de defender ou não a autonomia dos sírios como parece defender nossa diplomacia, nem em apostar que um enfraquecimento da Síria poderia favorecer Israel ( o que em parte é verdade) ou a posição do Irã dos aiatolás que sem o parceiro sírio estaria em dificuldades frente ao imperialismo ianque. Danem-se as estratégias geopolíticas. O povo sírio está sendo cruelmente massacrado sob os olhares complacentes do Ocidente. Não posso deixar de pensar em Sartre nesse instante, quando ele nos diz que a conivência com o crime nos transforma em assassinos.

Ainda o Canadá


Por falar em Canadá, nos dias que antecederam ao GP os estudantes de Montreal saíram às ruas para protestar contra o aumento das mensalidades universitárias. Deu confusão. O pior é que parece ter sido aprovada uma legislação restringindo as manifestações. Tristes tempos. Com a queda do muro de Berlim e o fim do socialismo real, criou-se a ilusão de que a democracia era um valor em si (parafraseando um “pensador” do Manhattan Connection). Parece não ser. Num mundo cada vez mais dominado pela voracidade do lucro a qualquer preço, o grito dos insatisfeitos soa como afronta para os defensores do deus dinheiro, com o beneplácito covarde de políticos e outros arautos do bem comum. Democracia sim, mas sem povo. Que o digam o Canadá e outros países democráticos como o Reino Unido, Chile, Rússia dentre outros.

Canadá


GP do Canadá de Fórmula 1, mais uma etapa de um campeonato bem interessante como há muito tempo não se via. Nos sete grandes prêmios disputados até aqui sete vencedores diferentes. E os brasileiros, uma vez mais, meros coadjuvantes. Depois da morte de Ayrton Senna não tivemos mais nenhum piloto capaz de despertar nossa paixão pelo esporte sobre quatro rodas.  Massa teve um lapso poucos anos atrás ao perder o título por um ou dois pontos na última corrida e ficar com o vice-campeonato. Mas com a chegada do bi-campeão Fernando Alonso (também um grande corredor ao lado de Lewis Hamilton) conformou-se a ser o segundo piloto atuando como funcionário público da F1. Como torcer por ele? Confesso que nunca morri de amores pelo Senna. Nadando contra a corrente da paixão nacional, eu era fã incondicional de Nelson Piquet, afinidade que nasceu em 1981 quando acompanhei, corrida por corrida, a trajetória do primeiro campeonato conquistado por ele.  Aliás, nadar contra a corrente parece ser uma mania que cultivo desde a infância. Fazer o quê? Recentemente tentei torcer para o filho do Piquet, mas, no caso em questão, o talento não parece ser genético.Com tanto medíocre por aí se aventurando pela Fórmula 1 e gostando de acompanhar o esporte como sempre gostei, não deixo de pensar depois de tanto tempo:  que falta que ele está fazendo.E estou falando do Ayrton.

Futebol: Messi faz a diferença. Neymar ainda não.


O argentino, melhor jogador do mundo, marcou três gols na seleção olímpica, um deles uma verdadeira pintura.  Neymar nada fez.  Ele é um bom jogador, na verdade o melhor em atividade no Brasil atualmente, mas ainda está longe de fazer a diferença na seleção. Apesar do que a mídia nativa possa pensar ou dizer.
Neymar não faz a diferença como a seleção brasileira parece não mais fazer. Antigamente eu sentia uma empolgação com os jogos da seleção até quando ela era comandada pelo Lazzarone (na minha opinião um dos piores técnicos que o escrete canarinho já teve), especialmente num jogo contra a Argentina. As pessoas se interessavam mais pela seleção, paravam mais para ver seus jogos. Hoje... Estava no centro da cidade na hora da partida, televisores ligados nos bares e restaurantes, mas não vi muito interesse nas pessoas. Parecia se tratar apenas de um jogo a mais dentre os tantos outros que os muitos canais transmitem de segunda a segunda.
Mas a própria lógica do futebol atual parece ter conduzido a esse estado de coisas. A seleção há tempos não joga no país e não podemos dizer que culpa disso seja a reforma dos estádios das cidades sede da próxima copa que afinal são apenas doze. Alie-se a isso ao fato de que a maior parte dos bons jogadores (nem vou falar de craques) atuarem em times do exterior. A globalização foi ruim para o nosso futebol. Qualquer jogador mediano imediatamente se transforma em um craque vendável para o exterior o que gera a necessidade financeira de colocá-lo (nem que seja na marra) em qualquer lista para qualquer amistoso da seleção. O resultado disso é uma geração medíocre ou de promessas que nem sempre se cumprem. E nem vou falar de mandos e desmandos e maracutaias tão próprias de nossa vida política como também, e nem poderia deixar de ser, de nosso futebol (e não só do nosso futebol. Taí o mais recente escândalo do futebol italiano que não me deixa mentir). Além de toda essa bandalheira, há também uma questão de identidade. Ou de perda de identidade. Nosso futebol perdeu a identidade com o Brasil e o resultado é ver o Neymar sendo engolido pelo mais uma vez pelo Messi.

Carros



Nada tenho contra a fé das pessoas. Somos livres para acreditar ou não no que quisermos. No mundo de hoje podemos louvar ao deus de nossa preferência apesar do desejo ardente de muitos fundamentalistas que querem nos converter ou na pior das hipóteses nos fazer viver sob seus ditames.
O fato é que moro no Luxemburgo há doze anos. Tempos atrás a Igreja Batista construiu um grande templo na Rua Luiz Soares da Rocha. Nada contra mesmo por que a nova casa trouxe mais movimento para a parte do bairro onde moro, mas o sossego acabou aí. São dezenas de carros estacionados em local proibido, fazendo manobras sobre a área livre do edifico onde moro, interrompendo o trânsito dos ônibus ao estacionar nos dois lados da rua. Não sabia que louvor a Deus e falta de civilidade andavam juntas. Como pode ser possível amar a Deus desrespeitando o direito de outros? Estou tentando entender.

domingo, 25 de março de 2012

Cinema

Sábado,andando pela Savassi, passamos pela porta do antigo Cine Pathé de tantas alegrias cinéfilas. A fachada foi tombada pelo patrimônio, mas o teatro tombou há tempos e a protegida fachada tornou-se uma triste ruína a atestar nossa desenfreada ganância, a força da grana que ergue e destrói (mais destrói) coisas belas. Foi nesse cinema que vi grande parte dos filmes que moldaram meu gosto desde Contos de Nova York (do trio Scorcese -Coppola - Allen), Cinema Paradiso, O Cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante e The Doors a megaproduções como O Paciente Inglês e Forrest Gump. O desaparecimento dos cinemas de rua parece ser um fenômeno nacional e mundial e Belo Horizonte fatalmente não escaparia dessa nova de "progresso". Mas o Pathé e sua fachada tombada pelo patrimônio mereciam destino melhor ao de apenas ficar de pé sofrendo as agruras provocadas por nossos lamentáveis instintos primários e a ação impiedosa do tempo. O Palladium de tantas outras alegrias acabou tendo um destino digno se transformando no belíssimo Centro Cultural do SESC. E o Pathé? Continuará apenas como fachada decrépita e tombada até quando? 
Depois do fechamento do Usina e do Savassi Cine Clube, o cinema de arte ou fora do grande esquemão americado ficou restrito ao Belas Artes e a Sala Humberto Mauro que, apesar das reformas realizadas no Palácio das Artes ainda precisa melhorar muito. Mas confesso que tive uma surpresa nesse último sábado ao assistir ao belíssimo Pina,de Wim Wenders, numa das salas do Cinemark do Pátio Savassi. Não que eu não conhecesse o conforto peculiar dessas salas, mas foi bom assistir ao filme em 3D numa sala de shopping vazia, apreciado apenas por quem de fato gosta de dança e de cinema. Sei que estou parecendo meio elitista, mas assistir a um filme convencional em cinema de shopping se transformou em provação para quem quer somente curtir um filme. Isso porque as pessoas não vão ao cinema para ver cinema. Os cinemões se transformaram em sucursais dos próprios shoppings e mais importante é conversar alto, rir e se empanturrar com as porcarias que são vendidas (e que acabam sendo mais importantes que o próprio filme).Ir a um cinema desses é como ir e se irritar com um picnic dos outros.
Isso para não falar dos aparelhos celulares, esse novo seio oferecido aos adultos que se recusam a sair da terceira infância.
Mas vamos ao filme: Pina é belo. Não é um documentário formal desses que estamos habituados a ver. Não está interessado em oferecer uma biografia da grande (e bela) bailarina e coreógrafa morta dois anos atrás. É um filme sentimental que nos coloca dentro de suas coreografias, mostrando os trabalhos mais importantes feitos nos últimos anos e revisitando os locais que são caros para a companhia. O ambiente urbano, a natureza, a relação com essa natureza. A narração fragmentada é construída por depoimentos de seus bailarinos. Texto e imagem, dança e emoção como a preparar o terreno para a grande reflexão da própria Pina Bausch que encerra o filme: Temos que dançar, dançar, dançar ou estamos perdidos. Sim. Via a arte, viva Wim Wenders, viva Pina Bausch.

Depois da tempestade a calmaria

Depois da overdose de teatro provocada pela 38ª Campanha de Popularização do Teatro e da Dança que esse ano adentrou pelos primeiros dias de março, Belo Horizonte mergulhou no marasmo pós-campanha.  Fiquei desolado ao abrir o Pampulha desse final de semana e constatar que temos apenas nove produções em cartaz sendo uma delas um stand up comedy. Se pegarmos a programação do Dia Internacional do Teatro que está sendo comemorado pelo Galpão Cine Horto temos então mais quatro outras produções a disposição e só. Uma miséria se comparada aos mais de cem espetáculos que estiverem disponíveis durante os dois meses de campanha e mais alguns outros em eventos paralelos. Há de fato uma ressaca pós-campanha, motivo pelo qual (imagino) muitos dos teatros públicos estão empurrando suas concorrências para depois de abril (é o caso do Teatro Marília e também da Sala João Ceschiatti), mas se alguém de fora que esteja passando o final de semana na cidade resolver tentar ir ao teatro irá encontrar bem pouca coisa à disposição, o que é uma pena. Esbarro com esse problema toda vez que viajo de férias para alguma capital do Nordeste. Como amante do teatro que sou sempre procuro alguma alternativa cultural que escape as opções geralmente oferecidas para turistas. E o resultado é que quase nunca encontro nada para assistir. Um ou outro show, um ou outro espetáculo e mesmo assim muita coisa de fora e geralmente com atores globais. Só fui feliz uma única vez em Recife. Para uma cidade que se gaba em ser o terceiro pólo teatral do país (posição que deve disputar com Porto Alegre e Curitiba) ter em um final de semana pouco mais de dez espetáculos em cartaz é muito pouco. Claro que há os custos de se manter uma produção e colocá-la em exibição logo após a campanha principalmente porque o público, eis aí o grande problema, não comparece com a frequência que se espera. De minha parte penso que para resolvermos esse problema crônico da escassez de público durante o ano deveríamos a longo prazo modificar substancialmente a educação básica nesse país porque cultura é uma questão de educação e a curto prazo sairmos um pouco dos limites da Avenida do Contorno e levarmos os espetáculos teatrais aos bairros cobrando ingressos mesmo que a preços simbólicos. Talvez seja uma saída. Fico triste quando vejo que nossa realidade teatral é ainda bastante amadora. Amadora no sentido de quem faz teatro e como o faz. Aos trancos e barrancos, com pouco dinheiro e atingindo pouco público. O teatro mineiro, tirando algumas exceções que confirmam a regra e tirando a época dos grandes eventos como a Campanha e o FIT, parece ter ainda pouca visibilidade perante ao público. E ainda há alguns artistas que não dão muita bola para ele...

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Cinema

Dois filmes assistidos nos últimos dias e que estão entre os indicados ao Oscar cuja cerimônia irá se realizar no domingo dia 26.
O Artista entra como franco favorito. Já levou três Globos de Ouro e sete prêmios Bafta (o Oscar britânico). Trata-se sem dúvida de uma bela homenagem ao cinema ao resgatar o antigo (e charmoso) filme mudo em preto e branco, resgatado até na abertura com os créditos sendo apresentados como eram feitos nos anos 30. A história da transição do cinema mudo para o falado já foi tratada pela sétima arte antes. Crepúsculo dos Deuses, de Billy Wilder, traz o drama de uma grande atriz do cinema mudo (Glória Swanson) que não conseguiu se adaptar aos novos tempos do cinema sonoro, a mesma história contata em O Artista. Outro exemplo é o brilhante musical de Dançando na Chuva de Gene Kelly. Pessoas que gostam de cinema gostam de filmes que homenageiam o cinema e é isso que O Artista faz. Ao final, quando é narrada a transição do cinema mudo para o sonoro via musicais que tornaram mais alegre um país atormentado pela grande depressão, dá vontade de aplaudir. É de se admirar também a interpretação dos atores (ambos indicados ao Oscar nas categorias de melhor ator e melhor atriz coadjuvante respectivamente) por resgatarem um tipo de interpretação para cinema que desapareceu.  E apesar de ter gostado do filme, de te-lo achado muito divertido, acho dez indicações para o Oscar um pouco demais (adoro essa contradição) e não sei se daria a ele o prêmio máximo de melhor filme. Como sou um ator que gosta de histórias acho o enredo meio pobrinho, mas muitos enredos dos antigos filmes mudos eram meio pobrinhos também. Enfim.
Fui ao Belas Artes com a intenção de ver  o iraniano A Separação e acabei assistindo (por uma questão de horário) a Dama de Ferro.
Acho meio problemático fazer filmes sobre personagens históricas ainda vivas. A despeito da brilhante interpretação de Helen Mirren em A Rainha, quando a grande diva inglesa vive a atual e longeva rainha de seu país, achei na época o filme menor por pintar com cores bem simpáticas uma figura tão controversa como o ex-primeiro ministro Tony Blair, principalmente tendo em vista no que ele se tornou ao aliar-se a George W.Bush na tragédia (para o povo iraquiano) que se tornou a invasão do Iraque. Enfrentar um filme que fala de Margareth Thatcher não era o programa que eu esperava, mas ela é vivida por Meryl Streep e isso já vale qualquer esforço.
Thatcher, ao lado de Reagan, foi (pelo menos para mim que sempre me coloquei no espectro da esquerda) o que de pior a política mundial produziu nos anos 80. Eles representavam uma onda conservadora triunfante depois da onda libertária produzida nos anos 60 e da época de ressaca e certo conformismo que foram os anos 70. Significavam o aniquilamento do welfare state keynesiano no mundo anglo-saxônico servindo de modelo para o famigerado neoliberalismo c ujos maléficos resultados todos agora conhecemos. Não sendo inglês ou norte-americano e sim sul-americano recém saído de uma ditadura de 20 anos e torcendo para que o sandinismo desse certo na Nicarágua, Thatcher e Reagan eram talvez as últimas pessoas na face da terra por quem eu nutriria qualquer simpatia.
Ao sair da sessão do filme A Rainha, confesso que sai sentindo alguma simpatia por Elizabeth II. Não é que Meryl Streep tenha me feito sentir simpatia por Mrs Thatcher, mas confesso que, mesmo não concordando em absoluto com muitas de suas idéias políticas, me senti inclinado a tentar compreender um pouco a pessoa e suas motivações. Acho que essa é uma bonita tarefa do trabalho do ator: dar humanidade as pessoas. Helen Mirren nos apresentou uma rainha comum, inserida no cotidiano do seu palácio de Buckinghan, às voltas com seus parentes complicados, tendo que resolver um problema em função da morte de sua ex-nora, um caso familiar que se tornou um problema político. Mas nos apresentou uma pessoa absoluta comum na qual até quem não tem um teto para morar (quanto mais um palácio) poderia se identificar. Bruno Ganz fez o mesmo com Hitler no filme A Queda.  Nos apresentou uma besta ensandecida e encurralada em seu bunker delirando com uma salvação que não chegaria, mas por mais  monstruoso e pérfido que tal personagem tenha sido e sem nutrir nenhuma simpatia pelo que ele fez e representou, é difícil não ver que ainda assim ali havia um homem. Streep, com a genialidade que é sua marca, faz o mesmo com Thatcher, principalmente nos períodos de decadência física e mental da líder britânica que afinal são o mote condutor do filme. A fita parece ter despertado antipatia em muitos lugares como na Argentina, por ter mostrado uma mulher gentil.  Não concordo. A Thatcher do filme A Dama de Ferro não é gentil, é uma mulher dura, obstinada, radical e intolerante com as opiniões que lhe são contrárias, mas ainda assim um ser humano com toda a sua fragilidade, como a mostrar que por trás de todo o poder, por mais forte que ele possa parecer (e Thatcher de fato foi uma das personalidades mais poderosas do século passado), não consegue esconder o barro e palha de que os homens são feitos.
E por falar em Argentina não vejo com nenhuma simpatia o fato de uma potência européia ainda possuir territórios coloniais em outros pontos da terra como é o caso do Reino Unido com as Ilhas Malvinas, afinal o sórdido colonialismo é (ou pelo menos deveria ser) coisa do passado. Claro que pela proximidade, o arquipélago deveria pertencer a los hermanos e não à coroa britânica. Ao mesmo tempo fico pensando qual o sentido dessa insistência argentina em querer reacender a questão como ocorre agora com o governo de Cristina Kirchner. Até onde eu sei as ilhas são habitadas por cidadãos britânicos que querem continuar a ser britânicos. Ou a população local não conta? A Guerra das Malvinas travada há exatos trinta anos foi uma loucura cometida por uma ditadura assassina já que pelas contas das organizações de direitos humanos produziu mais de 30 mil mortos e desaparecidos, mas estranhamente contou com uma adesão imediata da população oprimida. No começo do século XX o embaixador argentino em Londres havia dito que a Argentina era a mais brilhante jóia do Império Britânico. Não consigo entender essa sanha do país vizinho pelo arquipélago que não lhes pertence há quase duzentos anos. O governo argentino estaria em crise e está projetando a crise para o front exterior como é praxe em vários países?  Frente a isso tendo a ter a mesma opinião do ilustre Jorge Luís Borges ao responder, perplexo pela guerra a envolver os dois países que ele mais amava, que o melhor seria as ilhas à Bolívia que, por não ter saída para o mar, não sabia o significado da palavra Atlântico.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Baile dos Artistas

Bom ir ao  Baile dos Artistas na última sexta-feira e reencontrar o pessoal. Bom rever os colegas de profissão, a maior parte fantasiados como o impagável Leo Mendonza que atacou de "Safada do Dente", se divertindo na medida do possível. Sim, na medidad do possível por que o som não estava lá essas coisas e o atendimento dos bares, para ficar ruim teria que melhorar muito, muito mesmo. É incrivel como um baile que é realizado há tanto tempo erre assim de uma forma tão primária.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Curtas 2

Livros, sempre os livros. No meu último período de férias em Nova Viçosa levei na bagagem três livros que saboreei com prazer por que nem só de mar, água de coco e cerveja vive o homem. Primeiro A Trégua do uruguaio Mário Benedetti, belo romance em forma de diário de um viúvo na casa dos cinquenta anos que está prestes a se aposentar e que redescobre o amor. Benedetti é um dos grandes autores do vizinho Uruguai, país cujo literatura o Brasil praticamente desconhece. Há uma bela referência a ele no filme argentino El Lado Oscuro del Corázon, de Eliseo Subiela que foi exibido recentemente na mostra de cinema em língua espanhola no Belas Artes. O protagonista do filme atravessa o Rio da Prata, de Buenos Aires a Montevideo, entra em um café e pergunta a atendente se ela conhece Benedetti (o protagonista é dado à poesia), a atendente pergunta se o tal Benedetti frequenta o café... Pelo visto Benedetti é meio desconhecido por lá também.
Antes das Primeiras Histórias reúne quatro contos de Guimarães Rosa antes do mineiro ter-se tornado Guimarães Rosa. São contos interessantes e que não tem a menor relação com o universo que o escritor passou a tratar depois de Sagarana.O prefácio é de Mia Couto.
Por fim o livro Imagem de Lúcia Santaella e Winfried Nöth. Um grande e denso painel sobre a semiótica da imagem. Indispensável para quem trabalha com a interpretação dos signos. É conferir.

curtas

Messi foi eleito o melhor jogador do mundo mais uma vez. Cadê a novidade? O fato é que o argentino vem encantando desde que despontou no Barcelona, esse sim um verdadeiro time dos sonhos. Um pouco tarde para comentar, mas não pude resistir. Quem viu a final do mundial interclubes da Fifa viu a enorme distância existente entre os times europeus e os brasileiros. O Santos não viu a cor da bola e o aclamado Neymar (sim, um grande jogador, sem dúvida) ficou parecendo um ratinho em campo frente a um leão chamado Messi. Confesso que, tirando o papelão do Inter que ano passado foi eliminado na semifinal pelo desconhecido Mazembe do Zaire, nunca havia visto um time brasileiro levar um olé daqueles em final de mundial. Lição para o futebol brasileiro como um todo há apenas 2 anos da próxima copa. A imprensa ufanista veio  abafar o vexame dizendo que o Neymar é muito novo (19 anos contra os 24 de Messi). Ok, mas o grande Pelé não foi campeão mundial na Suécia aos 17 anos?

sábado, 7 de janeiro de 2012

Estamos de volta

Promessas para 2012: manter esse blog mais ativo. Prometo postar pelo menos um texto por semana.

2012 começou com muita chuva em Minas Gerais e também muito teatro com a 38ª Campanha de Popularização do Teatro e da Dança. Estarei em cartaz como ator no espetáculo Conversa Séria de Calcinha e Soutien, dirigida por João Valadares. De quinta à domingo na Sala João Ceschiatti no Palácio das Artes.
Para mim é uma experiência nova. Nunca havia trabalhado com máscara antes e devo confessar que esse trabalho de máscaras veio a luz quase que a base de fórceps dado o tempo exíguo que tivemos para remontar o espetáculo.
Sim remontar. O espetáculo havia estreado ano passado com outro elenco. Do escrete original só sobrou Fábio Schimitd. 
Outra novidade é o figurino primário: os atores de cuecas e as atrizes de calcinha e soutien.
Devo confessar que me apresentar seminu e com a barriguinha de fora me deixou, em princípio, meio encabulado. Mas são ossos do ofício. Que bom que pelo menos peguei uma cor no reveillon da Bahia (lá não estava chovendo).
O texto de João Valadares e Anderson Feliciano é livremente inspirado no clássico Entre Quatro Paredes de Sartre.
Uma vergonha esse auto-aumento promovido pelos vereadores de Belo Horizonte. Uma vergonha isso que se transformou o nosso legislativo municipal: uma reunião de nulidades políticas que se beneficiam de nossa falta de organização e de controle.
2012 também é ano de eleições municipais. Precisamos dar um basta nessa gente. O melhor a fazer é não reeleger ninguém.
E como o texto original de Sartre se passa no inferno, em nosso inferno (estou falando do espetáculo Conversa Séria de Calcinha e Soutien) os nossos ilustres vereadores nos fazem companhia. Pena que apenas em forma de piada.
Também estaremos em cartaz com os espetáculos Cuidado:Frágil!, também na Sala João Ceschiatti, de segunda à quarta. 
Já o Auto da Compadecida se apresentará no dia 27 de janeiro no Sesc Palladium e no dia 31 no Grande Teatro do Palácio das Artes.
Conversando ontem com o ator Leonardo Horta (que estará em cartaz na Campanha ao lado de João Valadares com o espetáculo Palhaços) me surgiu a ideia de iniciar nesse blog um debate sobre o tema teatro e diversão. Sim, ontem após a sessão de Calcinha e Soutien ouvimos alguém dizer que "se quisesse pensar ficaria em casa". Ok. Os críticos da Campanha (e são muitos) dirão que a Campanha acostumou o público da cidade a assistir comédias leves e sem profundidade. Tudo bem. Não sei se tais teses são válidas, pois  tendem a considerar o público como um imenso gado incapaz de escolher por si próprio o que assistir e a quantidade de espetáculos Cult presentes na campanha desmentem  um pouco essa história, mas fico pensando se o teatro também não teria desde sempre uma relação com a diversão, com o entretenimento. Fica a ideia para o debate. Se os leitores desse blog quiserem se manifestar...