segunda-feira, 25 de junho de 2012

FIT 2


É difícil para quem atua nas artes conciliar sua vontade louca de acompanhar tudo que o festival mostra com as urgências do trabalho, no caso a montagem de dois espetáculos que irão estrear no segundo semestre. Sei que estou perdendo muita coisa boa como “Voyageurs Immobiles”, “Estamira” (para o qual simplesmente não consegui achar ingressos), “Mistero Buffo” ou “Translunar Paradise” ou o israelense “Quiet” que dividiu tanto as opiniões. Outros eu optei por não assistir pelo tamanho dos trabalhos (mais uma vez a falta de tempo), é o caso de “O Idiota” (que pelo que soube também tem dividido opiniões) e “Ópera dos Vivos”. Mas vou deixar de falar do que não vi para me concentrar no que de fato consegui assistir.
Talvez eu seja um artista que esteja um pouco na contramão da moda teatral. Eu particularmente gosto de ir ao teatro para que me contem uma história, gosto, portanto, do teatro que preza a palavra bem falada e o ator que sabe conduzir sua fala, seu corpo e suas emoções em prol dessa exigência.
Dentro desse teatro que preza a palavra, gostei de dois espetáculos que vieram do Cone Sul: “Villa + Discurso”, do chileno Grupo Teatro Playa. Três belas atrizes se revezaram no palco do pequeno auditório da velha Fafich (que nunca deveria ter deixado de ser Fafich por mais que as instalações do campus na Pampulha sejam mais espaçosas). Um espetáculo simples e comovente. Necessário. A discussão sobre o destino a ser dado a um antigo centro de detenção, tortura e extermínio de opositores da época da sinistra ditadura de Pinochet, serve como pano de fundo para falar da própria condição do Chile pós-regime militar, dos dilemas da esquerda e da situação dos filhos da ditadura, como se parte da sociedade chilena desejasse passar a limpo aspectos de seu passado e seus laços com o presente representados pelo discurso de despedida da presidente Michele Bachelet, cujo pai foi morto pela regime de Pinochet.
É difícil não pensar no Brasil. Primeiro até por certa proximidade histórica entre a nossa presidente e a do Chile. E depois pelo tipo de teatro que é feito no país desde os anos 80. Aqui, quando se pensa em fazer algum espetáculo de cunho político cujo tema seja a ditadura ou suas sequelas, as pessoas não dão a menor confiança, pois trata-se de um assunto “datado”. O teatro praticado nos países vizinhos mostra que não. Que não se pode esquecer os abusos, as violações, os massacres, que não se pode simplesmente deixar esse passado de lado. Não é permitido esquecer e um bom caminho para o não esquecimento é falarmos disso tudo.
Outro bom exemplo de simplicidade, interpretação limpa e apreço à palavra é o ótimo “Tercer Cuerpo” dos argentinos do Grupo Timbre 4. Um cenário simples, um escritório que ao mesmo tempo é um bar ou um consultório médico onde cinco ótimos atores desfilam suas angústias, seus medos, sua incrível solidão. Assim como “Los Hijos Se Han Dormido”, mais um exemplo de interpretação realista contida, quase televisiva, que pode ser detestável para alguns, mas que eu considero um primor pelo rigor do que é dito e pelo trabalho sobre as emoções. Me deu vontade de ir para Buenos Aires estudar com eles. Quem sabe eu não faça isso ano que vem?
“Abito”, da Fondazione Pontedera Teatro é outro belo e instigante espetáculo. Um ambiente de sonho e alucinação no qual é mergulhado seu protagonista que não consegue retornar. Belo e tocante. Mais um mergulho na solidão, como o é, aliás, “Depois do Filme”, solo do diretor Adherbal Freire Filho. Um pouco sujo na atuação, como se o ator buscasse o tempo todo em sua memória as palavras que lhe faltam, mas muito interessante. Li recentemente ao excelente “Memória de Elefante”, de António Lobo Antunes. A história me comoveu. Histórias de solidões masculinas me tocam e a história recém lida me fez entrar no discurso de Adherbal e do Pontedera e me sentir parte deles.
Por fim, “Theatre”, do grupo tcheco Farm in the Cave. Teatralmente falando eu gostei mais do trabalho anterior mostrado na edição 2008 do FIT.  Mas como não se encantar com tamanha profusão física e vocal do excelente grupo do leste europeu. Muito mais um espetáculo de dança que de teatro a bem da verdade e que em determinados momentos me pareceu ser uma demonstração de virtuosismos, mas assim mesmo encantador e como a dizer que a dramaturgia contemporânea, para além da lógica das palavras (e eu que gosto tanto delas) consegue muitas vezes aportar com propriedade nos corpos e vozes de bons atores extraindo momentos sublimes.
Por questões de trabalho não consegui ver mais nada. Nem os “Sin, título: técnica mista”, nem “Gólgota Pic Nic” para os quais inclusive eu tinha ingresso. Mesmo tendo visto tão pouca coisa, penso que o FIT foi mais uma vez muito produtivo e deixou, como sempre deixa, aquele seu tradicional gostinho de quero mais.

domingo, 10 de junho de 2012

FIT


O FIT começou. Pela 11ª vez desde aquela tarde maravilhosa de 1994 (um ano muito bom para mim) em que os franceses do “Genérique Vapeur” encantaram a cidade com sua performance de ocupação coletiva.  Depois dos percalços da edição de 2010 que esteve a ponto de não acontecer por problemas de ordem política, a versão 2011 está sendo apresentada como a maior já realizada até agora. Nós que além de amarmos o teatro fazemos dele nossa profissão, esperamos que sim.
Olhando para a grade apresentada pelos organizadores há de fato muita coisa interessante para conferir, como, por exemplo, os tchecos do Farm in the Cave que brilharam por aqui na edição de 2008. Da seleção local fiquei surpreso com certas escolhas. Não vou entrar no mérito da qualidade artística dos trabalhos escolhidos, mas sinceramente não vejo sentido em duas coisas: primeiro, por mais que estudiosos e pesquisadores afirmem que as fronteiras entre as artes estejam cada vez mais tênues a ponto de termos dificuldades em definir, por exemplo, o que seja o teatro na contemporaneidade, não consigo concordar com a seleção de espetáculos de um grupo de dança, mesmo por que a cidade tem tantos festivais específicos (circo, teatro de bonecos, teatro de objetos, dança, performance) que não vejo justificativa para se colocar tantos gatos no mesmo balaio. Em segundo lugar a escolha de espetáculos que não são novidade na cidade, que já estiveram em cartaz alguns anos atrás e que não participaram de edições do FIT próximas ao ano de seu lançamento. O que aconteceu? Dentre os inscritos para a edição atual não haviam espetáculos ou outras companhias com qualidade suficiente? Ressalva feita a “Romeu e Julieta” do Galpão, por que afinal é um dos melhores espetáculos já produzidos no estado e o grupo está fazendo 30 anos e se apresentou mais uma vez no palco do Globe Theatre, etc. Mas não é o caso de outros trabalhos escolhidos.
Fico pensando nos critérios quando vou assistir a um espetáculo como “Los Hijos Se Han Dormido”, do argentino Daniel Veronese que já esteve por aqui em edições passadas à frente do grupo Periférico de Objetos. O espetáculo apresentado é uma versão de gabinete do clássico “A Gaivota” de Tchecov. Na montagem apresentada  não temos um desenho de luz, mas tão somente uma mesma geral branca,  um cenário beirando ao tosco – uma simples sala com três entradas, figurinos simples parecendo roupas do dia a dia que cada ator levou para o palco, nem trilha musical. Também não havia uma direção espetaculosa, nem tampouco uma teatralidade que saltasse aos olhos e, como estamos em um festival, o espetáculo parece se ressentir de não ter um conceito. O incômodo foi imediato. Dezenas de pessoas (mal educadas na minha modesta opinião) abandonaram o barco antes que ele pudesse atracar. Tudo bem. Um espetáculo tão pobre de recursos cênicos e ainda por cima falado em espanhol e com legendas projetadas acima da platéia, é demais.
Comentário que ouvi depois da apresentação: fosse montado por alguém de BH teria sido execrado. Certamente. Ou não, quem sabe?
O que vimos no palco do Grande Teatro do Palácio das Artes ontem foi uma exibição de técnica de atuação naturalista. Quase atuação para televisão ou cinema. O que me impressionou (e por isso gostei do espetáculo – minha eterna vocação de nadar contra a corrente) foi a consistência do trabalho dos atores expressa pela palavra bem falada (apesar de entedermos pouco a língua – o que é um pecado cultural – conseguimos identificar sua musicalidade), na construção das pequenas ações, no estar apenas olhando por uma janela e esse apenas olhar pela janela nos prende a atenção, nos corpos bem colocados em cena, sem exageros. Para mim foi uma atuação primorosa. Nada de cotovelo direito no céu da boca, nem palavras desconexas expressando a angústia contemporânea (em minha opinião expressando muitas as vezes a falta do que dizer). Já ouvi muita gente boa falar que teatro se faz com ator e texto (se bem que nesse último quesito há muitos que torcem o nariz) e quando aparece um espetáculo que é tão somente ator e texto as pessoas não gostam.
Meu amigo Tinho que mora no Rio já me disse que essa é meio que uma moda por lá. Uma atuação mais televisiva ou tendendo mais para o cinema. Pensei também em Eduardo Tolentino e em seu Grupo Tapa de onde saiu a premiada atriz Sandra Corveloni ( Palma de Ouro em Cannes por Linha de Passe). Eles certamente não teriam vez em BH. Diz a lenda que quando mestre Grotowski esteve em Pindorama assistiu espetáculos de vários grupos locais e que o que ele mais gostou foi do trabalho do Tapa. Enfim.
Voltando ao comentário ouvido à saída do teatro: foi o que me fez, mais uma vez, pensar nos critérios de escolha, na política do festival. Com certeza, se o espetáculo fosse local passaria bem longe do FIT como outros que se aproximam levemente da estética proposta por Veronese de fato passaram. Fico pensando em dois pesos e duas medidas. O que dizer?
Sei que gostei de ter visto apesar de ter tido dificuldades de me concentrar. Tudo bem que o Grande Teatro é uma sala que possa conter muita poeira, ácaros e mofo e que, por estarmos em junho, temos uma propensão maior a ter problemas respiratórios, etc. Mas o ambiente ontem estava mais para sanatório de tuberculosos do que para teatro. Meu amigo João ponderou que isso poderia ser uma reação da plateia ao próprio espetáculo. Pode mesmo, mas a orquestra de tosses começou tão logo as luzes se apagaram...
Legal também foi ter visto ao ótimo “Sua incelença, Ricardo III”, da companhia potiguar Clows de Shakespeare. Com direção de Gabriel Vilela, o trabalho parece ser uma verdadeira versão nordestina de “Romeu e Julieta” do Galpão. Não chega a ter a mesma poesia que o modelo mineiro, mas isso a meu ver se deve muito mais ao texto que é radicalmente diferente e também ao fato de o Galpão ter atores bem mais maduros. Um belo e inspirador trabalho.
Ponto de encontro: uma vez mais é no Parque Municipal. Eu continuo preferindo os bares tradicionais, ou seja, a minha velha Cantina do Lucas de guerra. Não curto bares da moda, a não ser que o bar da moda seja realmente um bom bar o que se traduz por cerveja gelada, boa comida, preços razoáveis e atendimento de primeira. Gosto de ir a um bar, sentar, beber e conversar. Ir a um lugar somente para ser visto como pessoa descolada não faz a minha cabeça. Mesmo por que o ponto de encontro sempre me pareceu uma quermesse Cult.

Síria


Até quando o mundo irá silenciar covardemente frente ao que acontece na Síria? Em quinze meses de protestos e luta por democracia mais de quatorze mil mortos. Se isso não for um genocídio eu não sei o que realmente é. Ou será que precisaremos chegar a cifra de um milhão de mortos para que a “consciência ocidental progressista” tome alguma atitude? Mas a Síria não tem petróleo e as potências do “mundo livre” não parecem dispostas a constranger Rússia e China tradicionais aliadas do despotismo do clã Assad, especialmente a última por óbvias razões. Não se trata de defender ou não a autonomia dos sírios como parece defender nossa diplomacia, nem em apostar que um enfraquecimento da Síria poderia favorecer Israel ( o que em parte é verdade) ou a posição do Irã dos aiatolás que sem o parceiro sírio estaria em dificuldades frente ao imperialismo ianque. Danem-se as estratégias geopolíticas. O povo sírio está sendo cruelmente massacrado sob os olhares complacentes do Ocidente. Não posso deixar de pensar em Sartre nesse instante, quando ele nos diz que a conivência com o crime nos transforma em assassinos.

Ainda o Canadá


Por falar em Canadá, nos dias que antecederam ao GP os estudantes de Montreal saíram às ruas para protestar contra o aumento das mensalidades universitárias. Deu confusão. O pior é que parece ter sido aprovada uma legislação restringindo as manifestações. Tristes tempos. Com a queda do muro de Berlim e o fim do socialismo real, criou-se a ilusão de que a democracia era um valor em si (parafraseando um “pensador” do Manhattan Connection). Parece não ser. Num mundo cada vez mais dominado pela voracidade do lucro a qualquer preço, o grito dos insatisfeitos soa como afronta para os defensores do deus dinheiro, com o beneplácito covarde de políticos e outros arautos do bem comum. Democracia sim, mas sem povo. Que o digam o Canadá e outros países democráticos como o Reino Unido, Chile, Rússia dentre outros.

Canadá


GP do Canadá de Fórmula 1, mais uma etapa de um campeonato bem interessante como há muito tempo não se via. Nos sete grandes prêmios disputados até aqui sete vencedores diferentes. E os brasileiros, uma vez mais, meros coadjuvantes. Depois da morte de Ayrton Senna não tivemos mais nenhum piloto capaz de despertar nossa paixão pelo esporte sobre quatro rodas.  Massa teve um lapso poucos anos atrás ao perder o título por um ou dois pontos na última corrida e ficar com o vice-campeonato. Mas com a chegada do bi-campeão Fernando Alonso (também um grande corredor ao lado de Lewis Hamilton) conformou-se a ser o segundo piloto atuando como funcionário público da F1. Como torcer por ele? Confesso que nunca morri de amores pelo Senna. Nadando contra a corrente da paixão nacional, eu era fã incondicional de Nelson Piquet, afinidade que nasceu em 1981 quando acompanhei, corrida por corrida, a trajetória do primeiro campeonato conquistado por ele.  Aliás, nadar contra a corrente parece ser uma mania que cultivo desde a infância. Fazer o quê? Recentemente tentei torcer para o filho do Piquet, mas, no caso em questão, o talento não parece ser genético.Com tanto medíocre por aí se aventurando pela Fórmula 1 e gostando de acompanhar o esporte como sempre gostei, não deixo de pensar depois de tanto tempo:  que falta que ele está fazendo.E estou falando do Ayrton.

Futebol: Messi faz a diferença. Neymar ainda não.


O argentino, melhor jogador do mundo, marcou três gols na seleção olímpica, um deles uma verdadeira pintura.  Neymar nada fez.  Ele é um bom jogador, na verdade o melhor em atividade no Brasil atualmente, mas ainda está longe de fazer a diferença na seleção. Apesar do que a mídia nativa possa pensar ou dizer.
Neymar não faz a diferença como a seleção brasileira parece não mais fazer. Antigamente eu sentia uma empolgação com os jogos da seleção até quando ela era comandada pelo Lazzarone (na minha opinião um dos piores técnicos que o escrete canarinho já teve), especialmente num jogo contra a Argentina. As pessoas se interessavam mais pela seleção, paravam mais para ver seus jogos. Hoje... Estava no centro da cidade na hora da partida, televisores ligados nos bares e restaurantes, mas não vi muito interesse nas pessoas. Parecia se tratar apenas de um jogo a mais dentre os tantos outros que os muitos canais transmitem de segunda a segunda.
Mas a própria lógica do futebol atual parece ter conduzido a esse estado de coisas. A seleção há tempos não joga no país e não podemos dizer que culpa disso seja a reforma dos estádios das cidades sede da próxima copa que afinal são apenas doze. Alie-se a isso ao fato de que a maior parte dos bons jogadores (nem vou falar de craques) atuarem em times do exterior. A globalização foi ruim para o nosso futebol. Qualquer jogador mediano imediatamente se transforma em um craque vendável para o exterior o que gera a necessidade financeira de colocá-lo (nem que seja na marra) em qualquer lista para qualquer amistoso da seleção. O resultado disso é uma geração medíocre ou de promessas que nem sempre se cumprem. E nem vou falar de mandos e desmandos e maracutaias tão próprias de nossa vida política como também, e nem poderia deixar de ser, de nosso futebol (e não só do nosso futebol. Taí o mais recente escândalo do futebol italiano que não me deixa mentir). Além de toda essa bandalheira, há também uma questão de identidade. Ou de perda de identidade. Nosso futebol perdeu a identidade com o Brasil e o resultado é ver o Neymar sendo engolido pelo mais uma vez pelo Messi.

Carros



Nada tenho contra a fé das pessoas. Somos livres para acreditar ou não no que quisermos. No mundo de hoje podemos louvar ao deus de nossa preferência apesar do desejo ardente de muitos fundamentalistas que querem nos converter ou na pior das hipóteses nos fazer viver sob seus ditames.
O fato é que moro no Luxemburgo há doze anos. Tempos atrás a Igreja Batista construiu um grande templo na Rua Luiz Soares da Rocha. Nada contra mesmo por que a nova casa trouxe mais movimento para a parte do bairro onde moro, mas o sossego acabou aí. São dezenas de carros estacionados em local proibido, fazendo manobras sobre a área livre do edifico onde moro, interrompendo o trânsito dos ônibus ao estacionar nos dois lados da rua. Não sabia que louvor a Deus e falta de civilidade andavam juntas. Como pode ser possível amar a Deus desrespeitando o direito de outros? Estou tentando entender.