segunda-feira, 1 de agosto de 2011

As razões do teatro

Não sou historiador do teatro mineiro. Na verdade, o que sei sobre ele é fruto de minhas observações durante os últimos 30 anos desde que comecei a freqüentá-lo.
O primeiro espetáculo teatral que assisti foi em 1984, “Quando Fui Morto em Cuba”, no Teatro Clara Nunes (que permanece fechado sem data certa para sua reabertura). Para mim foi uma emoção. Eu decidi ver tal espetáculo a partir de um comercial da televisão. Naquela época e em outras anteriores era comum ver anúncios de espetáculos teatrais na TV, me lembro de pelo menos dois deles: “O Olho Azul da Falecida” e “Laio ou o Poder”, mas não assisti a tais espetáculos.  Acho que se espremendo um pouco a memória ouvi os ecos de “A Prostituta Respeitosa”, “As Pulgas” e “Galileu Galilei”.
Enfim. O espetáculo de Breno Milagres (Quando Fui Morto em Cuba) foi o primeiro que vi por minha iniciativa, por que de verdade o primeiro espetáculo teatral que me vem a mente é “Quem Roubou a Perna do Saci” que se apresentou na Igreja Cristo Operário no bairro Planalto em 1974. Eu tinha então 10 anos e toda a minha classe de quarta série primária assistiu. Talvez eu devesse me voltar para esse texto e montá-lo nos dias de hoje. Seria um belo retorno à minha infância, ao que ela teve de bom.
Do teatro anterior aos anos 70 o pouco que sei ouvi de Jota Dângelo em conversa no BDMG que tenho gravada. Eu pretendia escrever um artigo, um livro, sei lá sobre o teatro feito nas Gerais e decidi entrevistá-lo. A partir de 1985, então calouro do curso de Comunicação Social da PUC, fui aluno do ator Arildo Barros na disciplina de teatro. Foi quando essa arte maravilhosa se abriu para mim e passei a freqüentar com assiduidade as salas de espetáculo.
Puxo tudo isso na memória para tentar refletir um pouco sobre o teatro que tenho presenciado desde que decidi me tornar ator profissional, isto é, os últimos 20 anos. E mesmo não sabendo muito sobre a história de sua prática no estado ouso afirmar que nas últimas duas décadas me parece visível que ela cresceu demasiadamente. Talvez possamos dizer mesmo que ela viveu uma espécie de boom e pensando assim me aventuro a conjecturar alguns motivos para esse crescimento sem estabelecer uma ordem de importância.
Primeiro o mundo encolheu ou, melhor dizendo, nossa visão sobre o mundo se ampliou com a hiper-informação. Nos anos 50 os atores da geração de Jota Dângelo eram poliglotas e liam textos teatrais em várias línguas, mas também viajavam para a Europa de onde traziam as novidades. A própria revolução no teatro brasileiro processada nos anos 40 no Rio e em São Paulo (falo da montagem inicial de “Vestido de Noiva” e da fundação do TBC) foi obra de artistas europeus que se radicaram por essas bandas e trouxeram as novidades que se montava por lá. A partir da década de 90 com o advento da Internet não é mais necessário sair de casa para ter contato com o que acontece na Europa ou nos EUA, pelo menos no que diz respeito aos novos textos.
Dentro dessa perspectiva o surgimento dos diversos festivais internacionais na cidade, em primeiro lugar o FIT cuja primeira edição aconteceu em 1994, muito embora suas raízes já estivessem plantadas desde a década anterior com o festival de teatro de rua que existia por aqui. O FIT colocou a cidade no mapa mundi do teatro e nos colocou cara a cara com outras experiências. Em certa medida o FIT veio cumprir um papel que antes era destinado ao Festival de Inverno da UFMG.
Em segundo lugar diria que do final dos anos 80 para cá vivemos uma fase de maior profissionalização da profissão. Claro que o reconhecimento da profissão de ator remonta aos anos 70, mas observo que com o advento das leis de incentivo à cultura, mesmo com todos os problemas, dificuldades e limitações incrustadas em tais leis, me parece inegável que elas propiciaram um certo ganho em termos de profissionalização da produção teatral local.
E seguindo o caminho da profissionalização destaco a ampliação da Campanha de Popularização do teatro por mais problemas que ela possa ter e por mais que parte da classe artística e da intelectualidade mineiras torçam o nariz. A campanha transformou o teatro mineiro em evento popular disputado o que, pelo menos do ponto de vista econômico é bem interessante.  
E finalmente destaco a importância das escolas de teatro da cidade. Primeiramente o Palácio das Artes e o TU que nos últimos anos vêem alimentando o mercado teatral com artistas bem interessantes e em segundo lugar o curso de Teatro da UFMG que busca consolidar a necessária dimensão de pesquisa.
Há que destacar também a importância do Galpão Cine Horto como espaço para reflexão, para o contato com diversos grupos que vem de fora e pelos vários cursos e produções que tem seu patrocínio.
Esse esboço de reflexão não pretende de forma alguma esgotar esse assunto. Constatar que vivemos em um bom momento da produção cultural (mesmo com todos os seus percalços) e buscar as causas para tal momento visa, sobretudo olhar para o futuro. Reconhecer as raízes do sucesso de muitos grupos e produções é reconhecer o trabalho de várias gerações em prol desse bem comum que chamamos teatro, principalmente em tempo de escolhas políticas como a que estamos vivendo com a eleição para o Conselho Municipal de Cultura.